quarta-feira, 6 de junho de 2012

Tema IV - A regulação dos Sistemas Educativos


O conceito de “regulação”
Numa União Europeia em que se preconiza a coesão social, uma educação para todos e o desenvolvimento económico sustentados numa sociedade do conhecimento com mutações sociais que ocorrem a velocidades vertiginosas, a regulação das políticas educativas surge como uma necessidade que os Estados têm de implementar. Esta regulação visa assegurar o equilíbrio, a coerência e a transformação do sistema, reajustando as ações dos indivíduos em função das normas definidas. Neste âmbito, Barroso (2003a, p. 19, citado por Almeida, 2005, p. 2) salienta que “É no contexto deste debate que, na educação, se promovem, discutem e aplicam medidas políticas e administrativas que vão, em geral, no sentido de alterar os modos de regulação dos poderes públicos no sistema escolar (muitas vezes com recurso a dispositivos de mercado), ou de substituir esses poderes públicos por entidades privadas, em muitos dos domínios que constituíam, até aí, um campo privilegiado da intervenção do Estado”.
Mas, o que significa o termo regulação? Qual é o seu significado?
De acordo com a Wikipédia, “Em sentido geral, regulação é o conjunto de técnicas ou ações que, ao serem aplicadas a um processo, dispositivo, máquina, organização ou sistema, permitem alcançar a estabilidade de, ou a conformidade continuada a, um comportamento previamente definido e almejado.1
No âmbito educativo, Delvaux (2001, citado por Almeida, 2005, p. 3) salienta que “a regulação é muito simplesmente aquilo que permite ao sistema funcionar e se transformar”. Nesta linha de pensamento, Diebolt (2001, p. 5, citado por Almeida, ibidem) sustenta que a regulação “(…) permite compreender como e porquê um conjunto de elementos, de ações ou indivíduos se organizam no seio de uma entidade global com fim de prosseguir uma certa finalidade.
No que concerne ao nosso país, Barroso (2005) refere que o “termo regulação está associado, em Portugal, ao objetivo de consagrar, simbolicamente, um outro estatuto à intervenção do Estado na condução das políticas públicas” (p. 63). Neste pressuposto, Barroso (2005) sustenta que “Muitas das referências que são feitas ao “novo” papel regulador do Estado servem para demarcar as propostas de “modernização” da administração pública das práticas tradicionais de controlo burocrático pelas normas e regulamentos que foram (e são ainda) apanágio da intervenção estatal” (idem). No que diz respeito à distinção entre regulação e regulamentação, Barroso (2005) frisa que “A diferença entre regulação e regulamentação não tem que ver com a sua finalidade (uma e outra visam a definição e cumprimento das regras que operacionalizam objetivos) (…) estas regras, estão codificadas sob a forma de regulamentos, acabando, muitas vezes, por terem um valor em si mesmas, independentemente do seu uso (ibidem, p. 64).
No âmbito dos processos de coordenação das políticas educativas, Barroso (2005, pp. 67-77) identifica os seguintes tipos de regulação: transnacional; nacional; micro-regulação local, ou ainda a regulação burocrático-profissional, pelo mercado, comunitária, caracterizando-os da seguinte forma:
A regulação transnacional é o conjunto de normas, discursos, instrumentos que sustentam os fóruns de decisão e consultas internacionais, adotado pelos políticos aquando da tomada de decisões para o funcionamento do sistema educativo.
A regulação nacional é o modo como o Estado coordena e controla o sistema educativo, orientando-o sob normas.
A micro-regulação local obedece a ordens emanadas da tutela, aplicando-as localmente, resultando no processo de coordenação da ação dos seus intervenientes: pais, alunos, professores, funcionários, gestores escolares.
A regulação burocrático-profissional exerce-se como uma política de compromisso entre o Estado e os professores, minimizando a influência das famílias e dos alunos.
A regulação pelo mercado ocorre através da influência das famílias no controlo da oferta educativa, através dos processos de escolha da escola e da sua participação na gestão.
A regulação comunitária efetiva-se através da parceria entre professores e pais dos alunos, nomeadamente na criação de territórios educativos de intervenção prioritária, condições de segurança da escola, abertura ou encerramento de escolas.
Mas será que a regulação das políticas educativas é infalível?
Nesta questão, o teórico da sociologia das organizações, Friedberg (1995, p. 147, citado por Almeida, 2005, pp. 4-5), sustenta que “(...) a regulação operada pela estrutura formal nunca é total. É constantemente extravasada por um conjunto de práticas que não respeitam as prescrições que ela promulga. Através destas práticas, os participantes, em função da sua perceção dos constrangimentos como recursos da situação, procuram, e a maioria das vezes com êxito, corroer pouco a pouco a consistência do quadro formal e deslocar ou limitar a sua validade, que o mesmo é dizer, subverter por completo as sequências teóricas.
Por conseguinte, os constrangimentos conduzem à subversão das regras e para que haja um controlo destes “desvios” à norma, importa, na análise da regulação dos sistemas educativos, ter em conta as três dimensões de que fala Reynaud (1997; 2003, citado por Almeida, 2005, p. 5 ):
a) a regulação de controlo, definida como o “conjunto de ações decididas e executadas por uma instância para orientar as ações e as interações dos atores sobre os quais detém uma certa autoridade” (Maroy e Dupriez, 2000, p. 76);
b) a regulação autónoma, entendida como um processo ativo de produção de ‘regras de jogo’, que “compreende a definição de regras (regras, injunções, constrangimentos, etc) que orientam o funcionamento do sistema, mas também, o seu (re)ajustamento provocado pela diversidade de estratégias e ações dos vários atores, em função dessas mesmas regras” (Barroso, 2004);
c) a regulação conjunta, definida como a interação entre os outros dois tipos de regulação, tendo em vista a produção de regras comuns (Reynaud, 2003).
É nesta linha de pensamento, que Barroso (2001, p. 7, citado por citado por Almeida, 2005, p. 5) sustenta que a regulação (do sistema educativo) não é um processo único, automático e previsível, mas sim “um processo compósito que resulta mais da regulação das regulações, do que do controlo direto da aplicação de uma regra sobre a ação dos regulados” (p. 7).
Por conseguinte, a regulação do sistema educativo visa controlar as práticas pedagógicas que se desenvolvem nas escolas, avaliando a sua qualidade, realizando os necessários ajustamentos e prestando, deste modo, contas à comunidade. Esta regulação assegura o equilíbrio dinâmico e a coerência do sistema, dando azo à transformação do mesmo através de uma articulação entre a regulação de controlo e os processos de interpretação e produção de normas nas organizações escolares. Na sociedade hodierna, a nível nacional e internacional, é indiscutível a necessidade de avaliar a Educação para que haja um controlo dos resultados e o cumprimento das metas educativas, responsabilizando-se, assim, os intervenientes neste processo.

Centralização vs Descentralização do Sistema Educativo
No que concerne à situação nacional, o Presidente do Fórum para a Liberdade da Educação, Fernando Adão da Fonseca (2003, p. 16, citado por Almeida, 2005, p.13), salienta que “a principal causa do relativo atraso cultural, social e económico de Portugal é a ausência de uma efetiva liberdade de educação”, sendo que o que se pretende é “desintoxicar os quadros mentais que, durante anos e anos... foram amordaçando o pensamento e o coração dos portugueses...”. Assim, podemos referir que o sistema educativo português, até aos anos 70, pautou-se pela centralização no que concerne à Administração. A prioridade era garantir o controlo do sistema e construir um equilíbrio entre a necessidade económica e a eficácia. Posteriormente, houve uma mudança de atitudes, pretendendo-se aproximar o serviço educativo do cidadão, aumentar a eficiência, facilitar procedimentos e tornar mais célere o serviço prestado pelo Estado. Na década de 70, inicia-se uma fase de desconcentração, transferindo-se as responsabilidades da Administração Central para a Administração Regional. Assim, segundo Dale (2008) as mutações que ocorreram nos últimos dez anos foram “mudanças no contexto político-económico mais abrangente; mudanças na ‘arquitetura’ dos sistemas educativos, incluindo as suas relações com o capitalismo e a modernidade, além das relações recíprocas entre eles; mudanças quanto à ‘capacidade’ (conceções sobre o que é factível) e ‘mandato’ (conceções sobre o que desejável) dos sistemas educativos; e mudanças quanto ao valor atribuído ao contributo dos sistemas educativos para a satisfação das exigências criadas por estas alterações de contexto” (p. 14). No entanto, foi a partir de 1986, com a Lei de Bases do Sistema Educativo, que se instituiu, em Portugal um novo quadro de regulação das políticas de Administração da Educação, fazendo parte deste sistema a descentralização/desconcentração, a autonomia e a participação comunitária (Ramos, n.d., p. 25). De acordo com esta autora, valorizaram-se as funções de conceção e coordenação da administração central, pois estas estruturas assegurariam uma interligação com a comunidade, através da participação de professores, pais, alunos, autarquias e interesses económicos e sociais (ibidem, p. 26). Para explicar a relevância dos conceitos de “centralização” e “descentralização”, Ramos (n.d., p. 4) salienta o seguinte: “E, se a centralização foi a metáfora fundadora do quadro político administrativo, representou uma forma de manter, ao longo dos tempos, a unidade nacional, como a História mostra, a descentralização é a metáfora regeneradora desse fenómeno e um dos pilares do regime democrático que define um outro paradigma socio-político”. Deste modo, enfatiza-se que para se viver em democracia é fundamental que os poderes estejam distribuídos e sejam exercidos para servir as comunidades. Será assim em Portugal? Na minha opinião, a descentralização total ainda não é uma realidade visível no nosso ensino, pois o Estado continua a deter muitos poderes, definindo os currículos, fiscalizando o ensino, gerindo os recursos humanos e os orçamentos. Paulatinamente, estamos a fazer um caminho que, na minha perspetiva, dará bons frutos.
De acordo com Ramos (n.d., pp. 6-7) podemos fazer a distinção dos conceitos de descentralização, desconcentração e autonomia da seguinte forma:
A descentralização administrativa corresponde a uma orgânica em que, na gestão do poder local, alguns interesses são atribuídos a pessoas coletivas territoriais. Estas possuem órgãos dotados de autonomia, atuando livremente no desempenho dos poderes legais mas sujeitos à fiscalização dos seus atos pelos tribunais (Caetano, 1980; Amaral, 1992, tal como referidos por Ramos, n.d., p. 6). Assim, no que concerne à política, a descentralização corresponde ao reconhecimento pelo poder político do direito de participação dos eleitos locais e numa consequente partilha de poderes e competências.
Por outro lado, a desconcentração consiste num processo técnico que tem como objetivo aumentar a eficiência dos serviços, dando azo a um conhecimento célere dos problemas, uma decisão rápida sobre as pretensões da sociedade civil, através da delegação de competências. No entanto, mesmo possibilitando a celeridade dos serviços, o tentáculo da Administração está sempre presente, ou seja, as decisões são tomadas a nível intermédio mas estão sempre sujeitas à inspeção e superintendência dos superiores.
Finalmente, referindo-me à autonomia regional saliento que não se pode confundi-la com a autonomia administrativa do poder local, nem as regiões autónomas se confundem com as regiões administrativas, previstas no artigo 256.º da Constituição da República Portuguesa (Ramos, n.d., p. 7). Deste modo, a autonomia regional, expressamente qualificada pela Constituição, como político administrativa envolve a atribuição de poderes substancialmente políticos às regiões, devendo destacar-se o poder legislativo, poderes administrativos e poderes de participação de órgãos regionais em atos de competência de órgãos do Estado (idem).
Sobre as vantagens da descentralização da política educativa, Weiler (1999, citado em Sarmento, 1999, p. 103) apresenta as seguintes:
. Redistribuição, relacionada com a divisão de poderes, postulado contraditório aos interesses das sociedades capitalistas avançadas, devido à “necessidade de manter o controlo” e “necessidade de garantir o mais eficazmente possível a reprodução das relações sociais vigentes com a ajuda do sistema educativo” (Sarmento, 1999, p. 102). Deste modo, os países que optam por uma política descentralizada, conservam uma participação suficiente na configuração da política educativa (OCDE, cit. Sarmento, 1999, p. 103);
. Eficiência, promovendo a eficácia em relação ao custo do sistema educativo, prevendo-se que os recursos educativos englobem recursos locais ou regionais e que os sistemas de gestão descentralizados utilizem de forma mais prudente e eficaz os recursos disponíveis;
. Cultura de aprendizagem, ao permitir adaptar o conteúdo educativo à especificidade do meio.
Um outro conceito a destacar é o da “desconcentração”. Ramos (n.d., p. 39) salienta os seguintes aspetos positivos do processo de desconcentração: a constituição de um interlocutor único junto das escolas para responder a todos os problemas e junto da administração central e da equipa governativa, permitindo religar o local e o central, articulando as várias valências do sistema e estabelecendo as relações com serviços de outros ministérios, assim como foi benéfico a transferência de competências. Como forma de regular este sistema educativo, são criadas as comissões de acompanhamento. A participação social na Educação assume-se como um processo de regulação das políticas governamentais. Ainda adentro deste processo de desconcentração, foi relevante a institucionalização do Conselho Nacional de Educação, assim como estruturas de participação na gestão das escolas. Deste modo, surge uma nova regulação, que reflete e demonstra diferentes perspetivas na resolução de problemas, emitindo pareceres e relatórios, informando o Estado das nossas políticas educativas e de como se encontra a nossa Educação. Um aspeto muito relevante a registar e que foi referido no fórum pela colega Lurdes “é que quaisquer que sejam as formas de regulação no Sistema Educativo estas devem respeitar os princípios da sua fundação, tais como: a universalidade do ensino, a equidade, a igualdade de oportunidades de formação, a socialização do indivíduo através da educação. Neste sentido, o sistema educativo contribuirá para que os cidadãos adquiram as competências essenciais para viver na sociedade do conhecimento.

A governação dos Sistemas Educativos e a construção de um Espaço Europeu de Educação
Na sociedade atual, a globalização está presente em tudo o que nos rodeia, exercendo a sua influência em todos os sectores onde a atividade humana se desenvolve. A Educação não é exceção. De acordo com Azevedo (2007, p. 22), como refere João Barroso (citado em Azevedo, 2007, p. 25) “A globalização afeta a educação escolar no plano nacional e a educação escolar nacional afeta o processo de globalização.” Assim, na observância das metas educativas europeias, as nações e os sistemas educativos nacionais tendem a normalizar quanto às estruturas e práticas educativas. Deste modo, cada Estado Membro assegura a sua identidade própria e o respeito pela sua cultura no Espaço Europeu de Educação (EEE).
Tal como já foi salientado, em Portugal, só a partir de 1986 (com a Lei de Bases do Sistema Educativo) é que se instituiu um novo quadro de regulação das políticas de Administração da Educação, fazendo parte deste sistema a descentralização/desconcentração, a autonomia e a participação comunitária. (Ramos, n.d, p. 25)
Recentemente, com o objetivo de definir uma política educativa comum aos Estados-Membros definiram-se objetivos e metas nos sistemas de educação e formação na Europa com o objetivo de aumentar a qualidade e eficácia dos Sistemas de Educação e Formação (SEF) na União Europeia, facilitar o acesso de todos ao SEF e abrir ao mundo exterior os mesmos. De realçar que todos os países definem explicitamente o setor da educação como prioritário e estratégico. E, uma das muitas diretrizes europeias realça que desenvolver as competências para a aprendizagem ao longo da vida deve ser uma das premissas em qualquer escola.
No domínio da Educação, é consensual que a União Europeia caminha a passos largos para a construção de um Espaço Europeu de Educação (EEE), onde as políticas transnacionais tendem a ter um papel decisivo na arquitetura dos diferentes sistemas educativos nacionais. Neste âmbito, Dale (2008) sustenta que “os sistemas educativos são os principais meios a que as sociedades recorrem para procurar definir, replicar e assegurar a sua singularidade nacional, para reforçar as economias nacionais e responder aos problemas sociais e para influenciar a distribuição de oportunidades individuais” (p. 17). Neste pressuposto e tendo como objetivo resolver estes constrangimentos são definidas novas prioridades para as políticas educativas nacionais. De acordo com Dale (2008) “A ausência de pressupostos comuns sobre o conteúdo da Educação e sobre o que torna os sistemas eficazes abriu a porta à criação de ferramentas de avaliação, o que permitiu que o que poderia ser visto como o problema da diversidade dos sistemas educativos europeus pudesse ser convertido numa oportunidade para a criação da base de um Espaço Europeu de Educação” (p. 22). De salientar que a Agenda de Lisboa ao legitimar a intervenção da União Europeia na qualidade dos sistemas educativos faz surgir, no Conselho de Lisboa, o Método Aberto de Coordenação (MAC), com o objetivo de “conduzir a uma mudança sem precedentes na política educativa de nível europeu” (Dale, 2008, p. 23), no âmbito do qual, são criados os indicadores e benchmarks a serem usados como referência de comparação e de divulgação de boas práticas pedagógicas, entre os Estados Membros. Deste modo, foram as próprias normas europeias a dificultar a construção e o sucesso do EEE, pois o Tratado de Educação define que “a educação obrigatória é da responsabilidade nacional (…) (tendo a Comunidade) de respeitar inteiramente a responsabilidade dos estados Membros (…) pelo conteúdo do ensino, organização dos sistemas educativos e sua diversidade cultural e linguística” (Dale, 2008, p. 20). Assim, o desenho deste Espaço Europeu de Educação limita-se à definição de competências de base que devem desenvolver todos os cidadãos europeus e “tem-se centrado em áreas exteriores às competências nacionais da educação, de “territorialidade” de cada Estado Membro, focalizando-se sobretudo, na aprendizagem ao longo da vida” (idem p. 21). Por conseguinte, no domínio da Educação e Formação, as orientações da Comissão Europeia colocam a sua tónica “na área de aprendizagem ao longo da vida, considerada condição essencial para atingir os objetivos de Lisboa” (ibidem p. 21).
No que concerne às transformações na Educação no espaço europeu, Dale (2008, p. 14), frisa que as mesmas encontram a sua raiz:
i)     Nas mudanças no contexto político-económico, uma vez que o Estado deixa de ser o agente controlador dos três pilares reguladores da Educação moderna (Estado, mercado, comunidade), passando esse controlo para entidades privadas e transnacionais;
ii)    Nas mudanças da arquitetura dos sistemas educativos;
iii)   Nas mudanças relativas aos conceitos de “capacidade” e “mandato”, passando o privado a ter uma primazia sobre o público;
iv)   No valor que é atribuído aos sistemas educativos como garante da satisfação das exigências criadas para proceder às alterações necessárias do contexto.
Neste âmbito, Dale (2008) refere o seguinte: “Considera-se que os sectores nacionais estão, por um lado, condicionados e destinados a servir matérias e interesses muito mais amplos do que os exigidos por Lisboa e, por outro lado, se revelam incapazes de prosseguir os seus objetivos. Estes sistemas carecem não apenas de reforma, mas de transformação, tanto quanto aos fins como quanto aos meios” (p. 19).
Sabemos que os defensores dos ideais neoliberais, argumentam que a promoção do livre funcionamento do mercado, através da devolução aos pais da liberdade de escolha, é a única saída para a melhoria dos serviços prestados pelas escolas. Assim, o Estado passa a ter uma nova função de regulação que é muito bem referida por Clementina Marques Cardoso (2003, tal como citada por Almeida, 2005, p. 15) “este tipo de Estado delega poder, autoridade e responsabilidades aos pais enquanto indivíduos e às comunidades empresariais; reduz a parcela dos professores no processo de decisão e o seu contributo na definição das prioridades educativas”, passando a definir metas e objetivos a nível central, realizando auditorias em representação dos pais e apoiando-se num sistema de quase-mercado. De acordo com Dutercq (2006) esta situação não é nada profícua: “Les stratégies de concurrence entre établissements qui se développent en France depuis plusieurs années, approuvées par beaucoup de parents et parfois encouragées par les collectivités territoriales, jouent de façon pernicieuse des éléments de quasi-marché qui existent ci et là.”
No caso português, de acordo com Ramos (n.d., p. 45) a participação da sociedade civil na Educação pode assumir diferentes formas de concretização:
     a) A contratualização entre o sector público e o sector privado empresarial e social;
b)   A partilha contratual com outros níveis de Administração Pública, designadamente a Administração Local;
c)   A participação pela via da representatividade em órgãos e serviços da Administração de sectores organizados da sociedade civil ou de individualidades independentes de reconhecido mérito (como acontece na composição do Conselho Nacional de Educação da Holanda);
d)   Ou, simplesmente, pela consulta feita pelas autoridades educativas a instâncias culturais e académicas.
Em suma, na minha opinião, a regulação é um processo complexo e dinâmico, que não se concretiza apenas pela aplicação de uma regra sobre os regulados mas sim pelo aperfeiçoamento contínuo desse mesmo processo. Assim, é fundamental que se opte por uma regulação sociocomunitária do Sistema Educativo e se respeite a identidade e a cultura de cada país.
Na Europa, a construção do EEE deve ancorar-se em políticas educativas comuns e conciliadoras, capazes de dar respostas aos constrangimentos e problemas que decorrem da globalização. Atendendo a que o investimento na Educação é muito pertinente para o desenvolvimento de qualquer país, a Europa deverá dar prioridade a este aspeto no seu orçamento e não compactuar com execuções financeiras “cegas” que não têm em linha de conta a formação ao longo da vida da pessoa humana. Neste âmbito, Antunes (2006) As bandeiras-projecto para a Europa de edificação do espaço europeu da educação e realização do paradigma de aprendizagem ao longo da vida são marcadas por ambiguidades e ambivalências várias, em que sobressai a traço grosso a ênfase na individualização dos problemas sociais e económicos, um novo pacto entre Estado e sociedade civil com uma distribuição distinta de riscos e responsabilidades entre a autoridade pública e os indivíduos face à educação e ao bem-estar social. Estaremos talvez perante a tentativa, criatura da tentação, de, através daqueles projectos, forjar os novos mitos legitimadores capazes de sustentar artefactos político-culturais para além das nações e dos Estados. O desejo de envolver no mesmo movimento a ordenação do território, físico, social e simbólico, e a criação dos sujeitos, parece estar no coração daqueles projectos. Alguns analistas duvidam que aquelas bandeiras-projecto constituam vias e reservas de recursos capazes de gerar formas de governação, sulcos de identidade e fontes de sentido para criar a ‘Europa’” (p. 88).
Para finalizar, considero que a ideia de um serviço público de qualidade deve ser defendida com muita determinação, pois na minha perspetiva, a Educação não deve estar subordinada aos mercados, nos quais se presta um serviço aos clientes, com acessos diferenciados por parte dos cidadãos.


Referências bibliográficas:
Almeida, A. P. (2005). Os fluxos escolares dos alunos como analisador dos modos de regulação local do Sistema Educativo. Lisboa: FPCE (Dissertação de Mestrado). (Disponibilizado nos recursos da U.C.)


Antunes, F. (2006). Governação e Espaço Europeu de Educação: Regulação da educação e visões para o projecto ‘Europa’. Revista Crítica de Ciências Sociais, 75, Outubro 2006. Pp. 63-93. Recuperado em 8 de junho de 2012, de: www.ces.uc.pt/rccs/includes/download.php?id=931


Azevedo, J. (2007). Sistema educativo mundial. Ensaio sobre a regulação transnacional da educação. Vila Nova de Gaia: Fundação Manuel Leão.
Barroso, J. (2005). Políticas Educativas e Organização Escolar. Lisboa: Universidade Aberta.
Barroso, J. (2005). O Estado e a regulação das políticas públicas. Educ. Soc., Campinas, vol. 26, n.º 92, p. 725-751, Especial. (Disponibilizado nos recursos da U.C.)
Dale, R. (2008). Construir a Europa através de um Espaço Europeu de Educação. Revista Lusófona de Educação. América do Norte, 11, Jul. 2009. Recuperado em 8 de junho de 2012, de:http://www.scielo.gpeari.mctes.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1645-72502008000100002&lng=pt&nrm=iso
Dutercq, Yves (2006). Que reste-t-il de l’État-éducateur?. Colloque International État et regulation sociale. Comment penser la coherence de l’intervention publique ?. Paris: Université Paris 1.
Ramos, C. C. (n.d.). Regulação dos Sistemas Educativos – O caso Português. (Disponibilizado nos recursos da U.C.)
Sarmento, M. J. (org.) (1999). Autonomia da escola, política e prática. Porto: Asa.


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